Desde a adolescência, eu sempre fui atraída pelo lado não convencional da Moda – especialmente com o movimento da contracultura, que se opunha aos padrões convencionais e rompia não só paradigmas da haute couture (alta-costura) como também do prêt-à-porter (“pronto a vestir” em uma tradução literal). E foi esse mesmo fascínio pelo diferente que me fez desistir do vestibular de Moda, ainda bem. Com o passar dos anos, minha percepção mudou muito – grande parte se deve ao amadurecimento e autoestima. A Moda mudou muito também, mas sinto que não mudou o suficiente. Só camuflou alguns problemas e preconceitos que seguem enrustidos em novas campanhas de Marketing.
CRESCIMENTO DA INDÚSTRIA PLUS SIZE NO BRASIL
O segmento plus size – que geralmente engloba tamanhos a partir do 46 – tem se expandido exponencialmente mas, ainda sim, persiste sendo um tabu para as grandes empresas que hesitam em investir. No Brasil, cerca de 120 milhões de pessoas vestem manequim 46 ou superior. Ainda sim, o nicho representa apenas 5% do varejo de moda no país. Os números não batem e só provam que existe um abismo e uma tremenda falta de exploração do mercado.
De acordo com uma pesquisa da ABPS (Associação Brasileira Plus Size), o consumidor plus size tem a pior experiência de compra possível. Esse consumidor já sai de casa sabendo que provavelmente não encontrará o que procura e, possivelmente, ainda sofrerá um péssimo atendimento. Mesmo em lojas do nicho, alguns empresários não investem em numerações acima do 52 porque acreditam que, desse número em diante, a pessoa já deve buscar ajuda médica e se tratar. Mas obviamente não é tudo tão simples assim e, não deveria caber a eles esse tipo de decisão sobre o corpo alheio.
Outro dado curioso é que, apesar do grande alvo do mercado ser o público feminino, os homens representam mais da metade do público plus size brasileiro, cerca de 64 milhões. O que é um outro problema por si só e, honestamente, não me sinto informada o suficiente para discutir. Mas gostaria muito de ouvir sobre a experiência de homens plus size.
FAST FASHION x SLOW FASHION
As grandes varejistas ainda dão passos tímidos aqui no Brasil. A Zara, que só carregava numeração até 42 e muitas vezes peças até o M, hoje já carrega algumas poucas peças XL e XXL (equivalentes aos 44 e 46) graças à uma adolescente catalã que comprou uma briga com a rede. A Forever 21, que nos Estados Unidos possui uma linha plus size bacana, aqui trouxe apenas para três lojas (Campinas, BH e Salvador – se não me engano) alegando que não havia demanda. A C&A, que tem parceria com uma marca plus size, só vende as roupas no e-commerce (gorda só compra online?). A Renner, rede brasileira, é a única que tem uma marca exclusiva para o público – a Ashua – que aos poucos está expandindo sua gama de lojas físicas.
Eu tenho dado preferência a marcas menores, slow fashion e afins. Principalmente marcas como a paulistana Wear Ever. Eu amo essa marca e não é segredo pra ninguém porque, além de peças básicas, eles trazem várias peças com estilos alternativos. Tenho mais algumas recomendações de lojas, mas fica para uma próxima pauta. Mas olhem essas fotos: representatividade é tudo.
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TAMANHO MIDSIZE: GORDA DEMAIS PARA SER MAGRA, MAGRA DEMAIS PARA SER GORDA
Ao explorar o YouTube esses dias me deparei com alguns vídeos que me apresentaram ao conceito de midsize ou in between sizes que a grosso modo são mulheres que transitam entre o manequim 42 e 46. Sempre vivi isso na pele, já que eu mesma oscilo entre esses manequins mas achei a a exposição válida. Muitas marcas (principalmente as de segmento luxo) acabam suas numerações no 42, algumas no 44. Lojas plus size começam a partir do 46 e às vezes, até do 48. E quem está no meio?
O problema é ainda mais complexo. A medida da brasileira média é algo entre o manequim 42 e 44 de acordo com uma pesquisa do SENAI (altura média 1.61m, 97.1 cm de busto, 85.1 cm de cintura e 102.1cm de quadril) mas, ao comparar as medidas com peças de grifes nacionais conceituadas, os tamanhos 42 e 44 são cerca de 10 centímetros menores do que deveriam ser para vestir confortavelmente as consumidoras. E isso obviamente não se restringe apenas as marcas nacionais.
O primeiro vídeo que me deparei foi o da americana Carrie Dayton mostrando o dilema midsize na Forever 21 – na loja ela prova peças no maior tamanho das linhas tradicionais e no menor tamanho plus size. Adoraria reproduzir algo parecido aqui, mas a F21 mais próxima com linha plus size é a de Campinas então, no momento, não rola.
Não fui de Forever 21, mas vivi uma experiência inusitada essa semana com a Levi’s. Eu sou uma fiel consumidora de todo jeans skinny de cintura alta, e uma marca que eu amo de paixão é a americana American Eagle. Mas como, infelizmente, eles não tem lojas por aqui eu resolvi me aventurar em outras marcas e outros estilos. Entrei no site, tanto no brasileiro como no americano, e inseri minhas medidas no provador virtual. O site brasileiro me recomendou o tamanho 43 (US 32) e o americano foi mais específico me recomendando o tamanho 32×28 (lá eles especificam o tamanho do comprimento da perna). Com essas medidas em mão, procurei o famoso jeans 501 que eu vinha namorando a tanto tempo. Não só encontrei como ainda estava em promoção, ganhei na loteria. Ou assim pensei.
⚡️ “comprando jeans online: o inferno midsize”https://t.co/8Eze3Npkye
— pat (@itspatriciasn) August 19, 2019
A calça não serviu, mas até aí tudo bem – é só pegar um tamanho maior. Eu obviamente não sou mais uma adolescente insegura que tem paranoia com tamanho de roupa em uma indústria onde não existe um padrão. E daí que a experiência começou a ficar estranha. Na teoria, a linha regular da Levi’s vai até o tamanho 34 (BR 45) e a linha plus size começa a partir do tamanho 46 (US 35 ou 16). Só que, o 501 – o modelo mais famoso e mais vendido da marca – só vai até o tamanho 32 (BR 43). Fui pesquisar na seção plus size, e eles não fabricam esse modelo (e cá entre nós, achei os modelos plus bem basicões e sem graça). Fora que se você veste mais do que 43 e menos do que 46, você é invisível e vive em um limbo. E foi assim que eu me senti. Não representada. Não foi a primeira e provavelmente nem a última vez.
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Depois daquele primeiro vídeo, fui pesquisar a experiência de outras meninas consideradas midsize. E cabe a nós fomentar essa discussão. Eu, você. Nós somos o agente de mudança. Pessoas jovens precisam crescer vendo vários corpos de manequins diferentes; e enquadrar essa “categoria” ao plus size é um desserviço.
A busca pelo midsize tem crescido; no Instagram a hashtag #midsizestyle já ultrapassa 54.000 utilizações. A blogueira Anushka Moore criou a conta Midsize Collective para dar visibilidade as mulheres que não se encaixam nos padrões tradicionais ou plus size. Mas a mensagem é a mesma: precisamos de mais positividade e aceitação no mundo da moda. Espero que essa discussão cresça por aqui também.
The Comments
Piu
MULHER, que post maravilhoso! Sempre fiquei muito incomodada não só com a falta de representatividade do mercado plus size, mas também com a falta de diversidade dentro dele, e acho que já passou da hora da gente discutir isso. Queria que a gente conseguisse conversar com marcas sobre essas coisas, viu!
Patty
PiuFico feliz que você gostou do post, piupoca!
Espero que o debate do midsize continue crescendo e que não só os influenciadores, mas o público também, consiga dialogar com as marcas <3
Gabe Pinheiro
Atualmente moro em Ouro Preto e em cidade do interior é ainda mais difícil encontrar peças com numeração maior. Pra você ter uma noção, não tem nenhuma loja voltada só para esse público e as poucas lojas que tem peças, não investem em diversidade e roupas bacanas.
Adorei o seu post e ele me fez olhar a moda de nova forma, ainda mais em relação aos tamanhos maiores. Eu sou magra, tenho menos de 1,60m e ler esse tipo de relato, me faz compreender as dificuldades que outros mulheres passam e ativa a chavinha de “o que eu posso fazer sobre isso?”.
Patty
Gabe PinheiroInterior tem muitas lojas pequenas e tudo gira em torno da decisão da pessoa que decide investir – e na grande maioria das vezes, não tem o menor conhecimento e/ou não se interessa em ter uma diversidade de produtos e até mesmo de público.
Fico feliz que eu tenha causado essa reflexão em ti e que você seja uma agente de mudança daqui pra frente também 🙂
Beijos <3